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quarta-feira, 4 de março de 2009

MIMETISMO 2


CRÔNICA 20


Quando fiz estágio em uma agência de publicidade há alguns anos, conheci um caso grave de mimetismo, porque, convenhamos, isto é uma doença e, muitas vezes, grave mesmo, pois afeta de tal modo a vida de certas pessoas que elas morrem sem ter vivido a própria vida. Era uma colega que foi parar ali por pistolão de um tio, pois precisava de emprego e se achava boa redatora. Na ocasião, estudava Letras e mais tarde acabou de fato professora.
Éramos todos jovens e trabalhávamos em uma equipe de criação dirigida por dois profissionais com experiência, responsáveis pelo produto final apresentado aos clientes. Não sei se sabem, mas numa agência as reuniões são diárias e há as chamadas brain storm, ou seja, as tempestades cerebrais, reuniões em que os participantes dizem tudo que vier à cabeça, sem censura, para depois discutirem estas ideias em estado bruto. Ora, como uma maria vai comas outras pode agir sem censura?
Depois de uma semana de trabalho, o diretor de arte percebeu que esta colega jamais apresentava uma idéia original, apenas repetia o que algum havia dito. Então, de maldade ou de bondade não sei, passou a iniciar as reuniões pedindo primeiramente a opinião dela sobre qualquer assunto. Ela gaguejava, dizia que cedia a vez e até reclamava de ser ela a iniciar reunião, como se fosse uma aluna da 3ª série do ensino fundamental. Não agia como a profissional que agora era, ou, pelo menos a estagiária. É claro que no final de três meses foi dispensada, à revelia do bom pistolão que possuía.
Por mais que o diretor tentasse, jamais conseguiu que ela desse a primeira opinião em uma reunião, pois ela simplesmente não conseguia, falava qualquer coisa, mudava de assunto, até que ele se cansava e, preocupado com o horário, passava a discussão com os outros, ignorando-a.
O curioso é que nas conversas fora do trabalho ela fazia questão de dizer que era ótima professora de redação, que era muito criativa, que escrevia muito bem e que, por ter todas estas qualidades, tentava um lugar na publicidade, em busca de uma remuneração certamente maior do que no magistério.
Não sei o que foi feito dela. Creio que provavelmente deve dar aulas repetidas em alguma escola, em que deve ter entrado por pistolão também, e nem desconfia que sofre de mimetismo. Doenças que, como todas as outras, tem tratamento, mas nem sempre cura.

Katia Sarkis

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